Notas de transcrição:
O texto aqui transcrito, é uma cópia integral do livro impresso em 1908.
Foi mantida a grafia usada na edição original de 1908, tendo sido corrigidosapenas pequenos erros tipográficos que não alteram a leitura do texto, e quepor isso não foram assinalados.
COLLECÇÃO ANTONIO MARIA PEREIRA—17.ºVolume
NOITES DE CINTRA
ALBERTO PIMENTEL
NOITES
DE
CINTRA
(2.ª edição, revista pelo auctor)
1908
PARCERIA ANTONIO MARIAPEREIRA
LIVRARIA EDITORA
Rua Augusta—44 a 54
LISBOA
COMPOSTO E IMPRESSO NA TYPOGRAPHIA
DA
{5}
Eramos dez, e tinhamos combinado, por desfastio, ir a Cintra, na primavera,ouvir os rouxinoes.
Parecerá menos inverosimil este pretexto, quando se disser que todos, entãoreunidos em Lisboa, haviamos nascido na provincia, onde as volatas dosrouxinoes dulcificaram as nossas primeiras noites de amor, e que o mais velhode nós tinha trinta e sete annos apenas.
Ainda assim, como prova involuntaria de que o melhor da nossa vida era jáentão o passado, não foi approvado o projecto sem uma correcção prosaica. Sim,iriamos ouvir os rouxinoes a Cintra, visto que elles não costumavam fazer-seouvir nas ruas de Lisboa, mas temperariamos esse devaneio romantico com asqueijadas da Sapa, as laranjas do visconde da Arriaga, e o Collares doconselheiro Francisco Costa.{6}
Como o mais novo de todos era o Gonçallinho Jervis, em cujo espiritobailavam ainda pagens e castellãs n'uma chorea medieval, e em cujo coraçãoardiam fogos de poetico platonismo, mettemol-o á galhofa convidando-o aprocurar na serra de Cintra um cabello da barba que Bernardim Ribeiro haveriaarrepellado ao vêr partir a frota com a infanta D. Beatriz.
Para falar verdade, nenhum de nós tinha grande confiança na realisação detão extravagante projecto, mas sobejou-nos motivo para o applaudir, porquedurante mais de dois mezes nos forneceu alegrissimo assumpto sempre que nosjuntavamos todos ou pelo menos alguns.
Deviamos partir em abril, segundo o programma primitivamente approvado emassembléa geral. Não fomos, e acreditavamos já que não iriamos, quando umanoite, no Martinho, resolvemos partir a 20 de maio.
O Vasconcellos, muito habituado a viajatas, ficou encarregado de alugar ochar-à-bancs, e elle proprio me disse á puridade que tal não fariasenão á ultima hora, porque duvidava que se realisasse uma excursão dependentedo accordo de dez pessoas, todas ellas mais ou menos atarefadas.
Como se tratava, porém, de um divertimento, de uma partie deplaisir, como lhe chamava o Leotte, aconteceu que, á hora marcada, apenasfaltou um, o Callixto, cuja falta, aliás, foi tida como de bom agouro, visto